segunda-feira, 19 de agosto de 2013

SONHO DE MENINO

Nasceu a Constança, Raínha dos nossos corações
A alegria, tal como o entusiasmo e a vontade de partilhar o momento é tanta e tão grande... que me faltam as palavras!... E é estranho porque são as mesmas palavras que ouço dentro de mim numa qualquer festarola de emoções e que se assaltam num turbilhão de ideias soltas e desorganizadas que invadem a silenciosa sala do meu escritório a favor de um imenso ruído de frases que se esmagam em gritos e empurrões de palavras umas às outras numa pressa louca de saltar cá para fora, mas ainda sem ordem ou apresentação.
Apetece-me gritar que parem!
Que me deixem pensar um pouco!
Explicar que se me permitirem vou poder organizá-las e assim poder trazê-las, a todas, para que venham ilustrar e revelar tudo o que me vai no coração e na alma e em todos os poros por onde respiro.
Reforçar-lhes a ideia de que será a partir delas que vou poder gritar ao mundo que de facto estou feliz, que renasci e que sou pai! Pai de uma menina. Pai da Constança! Pai... de verdade!

Hoje não me interessa a ordem dos factos.
Não me interessa o tamanho do texto. Apenas escrever, libertar a alma da prisão de sentimentos-contidos e deixá-la à solta pelos campos abertos de par-em-par, entre pequenas dunas de areia e colinas de flores cheirosas, mas com um vasto horizonte onde apenas a brisa possa correr sem machucar as delicadas pétalas coloridas que dão vida e que dão cor à felicidade que me assola aquecida por uma luz em forma de sol e de luar como se ambos se fundissem e também neles se reflectisse todo esse amor que me cabe - que já me cabe! -, no peito.

Assisti a todo o processo durante o trabalho do parto.
Estava lá quando apenas a mãe se queixava de dores.
Estava lá quando começaram as contracções.
Estava lá quando finalmente surgiu o primeiro tufo de cabelos, colados à nuca da cabeça...
Estava lá quando ela finalmente saiu.
Estava lá quando ela, por fim, abriu repentinamente os olhos... e cruzou os grandes olhos dela bem fundo, bem lá dentro de mim e dos meus pequeníssimos olhos (assim me senti quando ela os absorveu), plantados exactamente por cima dela.

Também lá estive enquanto a limparam, enquanto a cor dela se modificou e enquanto se esperava por um primeiro choro... que afinal não se ouviu.
Estava lá quando senti o primeiro momento de preocupação e responsabilidade por aquele pequeno ser que acabava de chegar ao mundo... tão frágil e tão... desprotegido. Senti as primeiras lágrimas rolarem no meu rosto. Estava feliz, no entanto chorava... em vez de sorrir!...

Uma nova família
Por momentos esqueci o papel da mãe, que estava bem, ainda com  dores e muito ansiosa, como eu, por conhecer a filha. Os meus olhos estavam colados na Constança. Ela era a minha luz, logo ali, na sala de partos, e eu sabia disso. Eu sentia isso. Eu não lutava para que fosse de outra forma! Para quê? Era mais forte do que eu!

Escrevo estas palavras à distância de oito dias. Os primeiros oito dias da Constança!
Os meus primeiros oito dias de uma nova vida!
De uma vida com sentido e de um novo sentido para a vida.
Todos os dias me enamoro mais pela minha filha!
Todos os dias cresce este sentimento há tanto tempo desejado e por tantos anos... conscientemente adiado.
Eu sei, sempre soube disso: nasci para ser pai e agora realizei esse meu sonho... de menino.
Não, não tem porque parecer estranho.
Pelo contrário, é até muito simples: cresci sem pai biológico e sempre, desde pequeno, pensei de mim para mim, que um dia viria a ser para alguém o pai que eu próprio nunca terei tido. E desde que me lembro, agarrado a essa ideia desde pequenino, este sempre foi o meu sonho mais antigo e que só agora, aos 40 anos, 3 meses e 11 dias, finalmente concretizei. E que sonho!!
Tudo o que vier a seguir jamais será fruto de um desejo tão forte e tão antigo como este meu sonho de menino!

PROMESSA DO PASSADO
Com o nascimento da Constança também é verdade que caiu por terra uma promessa antiga e que se manteve por mais de 20 anos. A história foi contada de namorada-em-namorada e mantive-me sempre fiel à intenção de assumir em cada relação, que um dia teria de poder cumprir a minha palavra. Tinha 16 anos e prometera a uma namorada de então que se "o meu primeiro filho for menina... terá o teu nome" e esse nome era Áurea. Fui sempre verdadeiro e sempre contei sobre essa promessa de adolescente apaixonado e quando tivémos de discutir os possíveis nomes... "Áurea" ainda avançou várias etapas, mas, de facto, "Constança" foi o nosso preferido.
Houve mesmo quem sabendo da história e habituado a ver-me sempre tão cumpridor da minha palavra, ainda me provocasse a respeito do assunto, mas, sem meios, nem porquês, a explicação é muito simples: foi mesmo por uma questão de gosto!
Quanto à Áurea, a que foi namorada há 24 anos atrás e de quem nada sei há mais de... 15..., sei que compreenderá a minha decisão e talvez nem se lembrasse mais da promessa que um dia terei feito. Para todos os efeitos fica aqui o meu reconhecimento público da promessa quebrada. A primeira que não cumpri em consciência e disso não posso gabar-me.

MENINO OU MENINA?
"Talvez sempre soubesse a resposta..."
Talvez sempre soubesse a resposta a esta questão, mas a verdade é que optámos por deixar a resposta para o momento do parto. E mesmo isso foi negociado! Mas já lá vamos...
Antes explicar apenas que desde há muitos anos que quando se pedia que se apertasse o queixo para se "saber" se ia ter um menino ou uma menina, a mim surgia sempre como resposta "menina", visto que unido o queixo entre os dedos ficava sempre o aspecto de uma "passarinha" com a risca do meio a encolher salientando duas faces laterais. Voltei a recordar-me disso na viagem de regresso a casa, no dia em que nasceu a Constança e, ao voltar a tentar o gesto, de frente para o espelho retrovisor do carro... lá estava ela, a mesma "parreca" de sempre!
Também sonhei, por duas vezes, na fase final da gravidez com duas meninas. No primeiro sonho, recordo-me, era uma menina já rechonchudinha, dona de uma beleza invulgar e de uns olhos incrivelmente azuis e vistosos! Mas... azuis?!? Como? Quando muito verdes ou esverdeados ainda percebia, porque fazem o meu tom castanho-esverdeado, mas... azuis?!? Bem... a mãe dela diz que sim, que pode puxar a parte da família materna onde existem (e eu conheço) pessoas com os olhos claros.
Bem... também foi só um sonho! (?)

CATALUÑA - ESPAÑA
O quarto da Constança preparado quando apenas era um bebé
Correm os tempos em que os segredos e mistérios da gravidez estão anulados por força das novas tecnologias e facilidade em antever o sexo dos bebés logo nas primeiras ecografias.
Quando soubémos da gravidez, imediatamente a seguir começaram as questões da mãe que dizia querer saber o sexo do bebé, face à minha ideia de não querer saber o sexo. Porque havia as questões relacionadas com o quarto do bebé, as roupas, os nomes... tretas! Tudo isso - como se provou de resto - não tem a menor importância. Quando comecei a perceber que podia não conseguir levar a minha a avante, mudei de estratégia. Deixei de atacar e dei a iniciativa. Mostrei que começava a abandonar a ideia e saí-me com novo flanqueamento: "filho meu tem de nascer em Espanha!", assumi, "e digo mais, em Barcelona, no Reino da Catalunha".
Aos porquês enchi-me de razão para falar da Crise que se vive, da capacidade de independência que estes teriam face ao resto de Espanha, ao anunciado colapso destas terras lusas viradas ao Atlântico, que de tolo já bastava o Rei que pegou no cavalo e veio a galope contra os mouros e sempre em direcção ao Sul, e até das possíveis férias que poder-se-iam fazer em Agosto - o mês previsto para o nascimento -, nas praias de Barcelona. A história pegou e ao claro e estampado rótulo de louco que me foi imediatamente atribuído, respondi prontamente: "estás a ver?!? Nenhuma das minhas sugestões é aceite! Prefiro a surpresa do sexo, tu queres saber; gostava muito (é sobejamente conhecida a minha inclinação e defesa a favor de Espanha e como me irrita D. Afonso Henriques que desde logo mancha a História ao bater na mãe, mas piora muito mais quando funda um Portugal independente de Espanha!!) que o meu filho nascesse em Espanha e tu que fazes? Estás a cortar a ideia!..." Insisti nisto o suficiente para me tornar crivel. E... para suspresa minha ouvi a primeira cedência na negociação: "pronto. Nesta ecografia não vamos saber... mas não prometo nada!"
Eh! Eh! Eh! Eh! Estava no papo!!!
A verdade é que para o final da gravidez ela até já fazia o mesmo gosto que eu em manter a ideia da surpresa e ela mesma lembrava sempre, em cada consulta, que nós não queríamos saber o sexo do bebé!


Em Roma como aqui, o anúncio foi recebido em júbilo
ABBIAMO BAMBINA
À imagem do fumo branco que se esvai de uma chaminé em Roma aquando do anúncio de um novo Papa, também a nossa menina foi anunciada ao mundo (no mundo do facebook) por um fumo... rosa que se precipitava a partir de uma chaminé para gáudio de todos aqueles que anseavam pelo anúncio. De uma só vez e de forma mais completa do que a Igreja Apostólica Romana, com o mesmo fumo anunciávamos o sexo e revelávamos o nome escolhido. De imediato surgiram as mais variadas reacções e todas elas... evocando o nome "Constança" nos comentários. Aposta ganha!


FACTOS E COINCIDÊNCIAS
Não só de certezas se escreve este relato.
Houve imensas coincidências que à luz dos acontecimentos foram, afinal factos confirmados.
Primeiro a minha convicção: "filha minha, para não criar embaraços profissionais ao papá, vai nascer num fim-de-semana", assumi por diversas vezes principalmente à mãe, que teimava em afirmar que eu estaria em viagem quando ela entrasse em trabalhos de parto. Nasceu num domingo.
Outro: "filha minha não vai prestar-se a grandes choradeiras! Vai saber estar e comportar-se. Quase nem vai chorar, garanto!" Na verdade ela não chorou quando nasceu. Estava muito curiosa com tudo, mas não chorou. Isso assustou-me filha, porque esse choro era gratuito e estava previsto acontecer. Eu não me incomodaria.
Resultado: andei sempre na expectativa de ouvi-la chorar, o que na realidade faz a espaços, apenas (mas tem uma boa goela!!).
"Não só de certezas se escreve este relato"
A hora do parto. Depois de a mãe muito sofrer entre contracções e dilatação, eu mesmo fiz um cálculo e apresentei ao médico obstetra em jeito de aposta e de desafio: "até às 15 horas o bebé está cá fora, vai ver!", disse-lhe eu quando apenas havia 6 dedos de dilatação e era quase meio dia. Às 13h41, isso aconteceu.
Talvez tenha sido bom eu ter estado calado mais vezes do que a dar palpites, não fosse dizer mais alguma coisa que não devesse!
Por fim a mais terrível das coincidências: imediatamente antes de nascer a Constança, dei entrada nas urgências do hospital e acabei por lá ficar internado durante nove dias. Fui operado, fiquei sem a vesícula, houve ainda espaço para uma pancreatite aguda... enfim! Saí numa quinta-feira à tarde para descansar um pouco em casa e a minha filhota nasceu nesse intervalo, como se tivesse estado à espera. Mas nasceu e... ficou internada na neonatologia porque a mãe fez febre durante o parto e a bebé esteve a tomar antibiótico.
Quanto tempo de internamento?!
.... pois foi: nove dias, como o pai!
"(...) senti o primeiro momento de preocupação"

PARA A VIDA
As palavras, quando escritas, ficam gravadas para sempre. O mesmo não acontece quando as pronunciamos porque o tempo vai encarregar-se de processar outras palavras por cima e num certo momento, daquela conversa já só sobra uma ideia e... mais tarde, até isso fica esquecido.
Vou poder contar à minha filhota como, quando e em que circunstâncias se multiplicaram uma série de acontecimentos, mas mesmo quando eu já for velhinho e a minha memória estiver preenchida com muitos mais espaços em branco do que filmes vividos, ela vai sempre poder vir aqui e ler cada etapa que me permitiu viver antes, durante e após o nascimento dela.

Como poderei esquecer aquela ecografia das 20 semanas em que se ampliou o pequeno rostinho do bebé e se percebeu pelos lábios qualquer coisa muito precoce como o bebé estar a dizer "papá"?!? Incrivel de facto, mas aconeteceu diante mim, da mãe e da obstetra que fazia o exame.
Como vou poder esquecer aquele momento imediatamente após o parto em que ela sai em posição contrária à esperada, a olhar para cima, de olhos fechados e quando eu me inclino mais para cima dela, naquele momento ela... abre os olhos enormes e me fita não nos olhos, mas na alma? Que sensação incrivel foi aquela??!!?
O primeiro colo que lhe dei, antes ainda da mãe. O primeiro biberão, a primeira muda de fralda... como posso impedir que todas essas marcas não venham a ficar comigo para toda a vida?
Nem queria outra coisa, de resto.

Agora somos uma família.
Para o que der e vier teremos de estar juntos e ultrapassar juntos os desafios que surgirem pela frente.
Agora, mais do que nunca, mais fortes e mais coesos!
"Não posso viver sem vocês porque agora somos uma família", disse-nos a mãe, babada de emoção.

3 comentários:

  1. Sem coment'arios...
    Simplesmente fantástico este relato MILITO
    Muita saúde para poderem cuidar da Constãnça , e felicidades..
    O que mais podemos desejar?

    Beijinho grande

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  2. Que pai babado!! Está a correr tudo bem? Bj grande para a Constança da tia mazona.

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  3. ao ler consigo ouvir-te e sentir todas as tua emoções, continuas um poeta, um apaixonado pela escrita, e agora com uma inspiração maior, a tua família . beijo grande e vai dando notícias

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